O ETERNO RETORNO DE SE SABER REPLETO DE UM IMENSO VAZIO.

    Às vezes paro, e nesse breve momento de reflexão profunda (ou profundamente superficial, não sei ao certo), penso que o tempo chegou a não passar como deveria ter passado, não foi como deveria ter sido. Digamos assim, que ele fez o trabalho pela metade. Muito pouca coisa mudou de uma maneira verdadeiramente efetiva. Mudaram os horários, hábitos, lugares, inclusive as pessoas ao redor (ah sim, sempre tem essas pessoas ao redor). Sim realmente são outros rostos e outras vozes estas que estão a interagir comigo (ou me ignorando, quem sabe), e, em um grau até simplório me atreveria a dizer, tentando me modificar.

    Mas não, não surgiram novos valores (bem que eu gostaria que houvessem surgido, ah que falta fazem as coisas que nunca tive), e, muito menos outras vontades, estas continuam vorazmente insaciáveis, da maneira que sempre foram, e pelos mesmos motivos, ávidas pelas mesmas coisas. Os velhos demônios continuam lá, embaixo da minha cama ou dentro do meu armário, me espreitando com seus olhos amarelos (nada pessoal, às vezes até gosto de tais olhos...), enquanto eu continuo a perseguir sempre as mesmas “belas borboletas” (bem, no meu caso fugindo de “velhas mariposas”).

    Entre velhas novidades e novas antiguidades tudo continua aparentemente igual, pessoas morreram, outras nasceram, mas tudo aparentemente mantêm-se inalterado, pelo menos em essência já que os mortos nunca partiram e os vivos nunca chegaram, “deixe os mortos em paz, eles não levantam mais” diz uma canção ao longe no rádio. Como é difícil viver carregando um cemitério na cabeça. Embora se tenha uma ilusão de constante movimento e mudança (que chega a ser alucinante em alguns momentos), a verdade é que em essência as coisas continuam a ser o que sempre foram. Mesmo que sejam outros lugares, outras pessoas e outras situações, ainda seremos nós mesmos a estarmos repletos desse imenso vazio que é viver.

    Tudo é um ciclo a que se está fadado a reviver, é um eterno retorno da qual a sua consciência não alivia nem liberta. E chego à desesperadora e angustiante constatação de que essa pujança pela mudança nada mais é que a incapacidade de aceitar a natureza das coisas que são como devem ser. A perseguição pelo novo nada mais é que o absurdo de querer viver a mentira que é não aceitar aquilo que se é. E continuo assim absorto nesses pensamentos profundamente superficiais. Ou seriam superficialmente profundos? - quem vai saber.

 

#HAM23