Observações distorcidas da realidade: o desejo como fonte primal da vida e da morte.

   Observações distorcidas da realidade, na verdade a própria realidade, ou ao menos aquilo que se entende por ela é uma distorção, tudo não passa uma série de pontos de vista e percepções abruptas pré-ordenadas pelas concepções pessoais e coletivas dos seres sociais em conjunto com seus anseios e desejos, de modo que o elo conformador da sociedade e de modo mais amplo da própria realidade é o desejo em uma escala bem maior e vazio o impulso suscitado pelo mundo líquido.

    O desejo, portanto, é a fonte primal e fim último de tudo que é vivo, sendo o início da vida inteligente (de uma forma extremamente pretensiosa), posto que somente se possa desejar quando o “ser” dá-se conta de que “é”, percebendo sua individualidade em face ao corpo social, em face por assim dizer da “instrumentalidade humana” e criando-se a sua pessoalidade e sua personalidade, distinguindo-se desse modo, a peça e o jogo, e de uma maneira mais ampla (quando se consideram os diversos estratos sociais e os jogos de interesse que permeiam a dinâmica social) a peça e o jogador.

    Ao passo que o próprio desejo como força motriz da vida, também é o encarregado pelo seu fim, visto que a sua não consecução é a mãe de todos os males, entendamos dessa maneira: a infelicidade nasce quando se não pode concretizar aquilo que foi desejado, de modo que o controle das expectativas que se faz em determinadas situações seria o essencial para o afastamento das lamúrias, ao passo que a frustração pela não consecução de um projeto estaria afastada pela aceitação da realidade tal qual como ela é, porém o “ser pensante” deseja sempre mais do que pode, visto que a compreensão de sua própria potência frente á vida sempre superestimada, sendo, portanto, algo que lhe é intrínseco, na qual impera em muitos aspectos do corpo social o pensamento de que o homem pode a todo momento modificar a realidade de modo irrestrito (e aqui reside a raiz da destruição, seja porque determinadas incursões no ambiente vivo - ou melhor ser vivo coletivo - trazem riscos irreversíveis, sejam porque a impotência frente às situações reais se demonstram deveras perigosas para a manutenção da sanidade mental em mundo cada vez mais imediatista e impaciente), ao passo que somos levados a crer que tudo podemos, encenando assim verdadeiros deuses olimpianos, embora nos esquecemos de que para que um deus o seja, é necessário que seja venerado.

    De modo que a própria realidade assume assim uma forma extremamente distorcida e vazia de um sentido válido, ou fazendo uso de uma visão absurdista e pessimista (ou deveria ser realista), repleta de um significado ininteligível e intangível pelo/para o homem, provocando-lhe a angústia pelo desejo de querer entender aquilo que está fora de seu alcance. E logo o desejo não concretizado é a porta de entrada para a frustração e consequente tristeza face aos objetos da vida, de modo que representa uma diminuição na sua própria potência de viver.

   Seguindo este aspecto o ponto central de entendimento da realidade e sua consequente manutenção em uma sociedade equilibrada e sã é justamente o controle de desejo, visto que sua total supressão (e logo a felicidade plena) é impossível, admitindo-se assim que o desejo deve ser pautado dentro de um grupo de variáveis possíveis e necessários em que o tempo de maturação de cada coisa é necessário, porém tal “anseio” é cada vez mais distante frente à hipervelocidade dos impulsos e desejos desta sociedade pós-moderna e líquida, fazendo-se com que a realidade seja algo cada vez mais distante, enquanto os seres humanos individualizam-se cada vez mais em seus mundos particulares de desejos e anseios impossíveis, aumentando sua frustração e consequentemente os prendendo irreversivelmente em suas quimeras.